domingo, 25 de março de 2007

DIAS - Europa: Bodas de Ouro

O texto que se segue, de Fernando Madrinha, saiu no Courrier Internacional, de 23 a 29 de Março de 2007, - Editorial.


Dar tempo ao tempo

Meio século de paz, num século com duas guerras mundiais. Várias democracias conquistadas numa época em que elas abundavam. Melhor distribuição da riqueza, não só em cada um dos Estados-membros, mas também entre países muito diferentes e com diferentes níveis de desenvolvimento. Um mercado único com livre movimentação de trabalhadores e de mercadorias e até uma moeda própria que já circula em 13 países, devendo ser, aos poucos, adoptada por todos. Uma organizaçao que começou por ser um clube de ricos, com apenas seis "sócios" - Alemanha, Bélgica, França, Itália, Luxemburgo e Holanda - e que desde 1 de Janeiro tem 27 menbros, todos dispostos a abdicarem um pouco da sua soberania e a partilhá-la, em múltiplos aspectos, para benefício comum. Eis os factos e feitos principais da União Europeia, cujo aniversário se celebra no Domingo (25 de Março). Assim como há pessoas que têm uma idade real diferente da que consta no Registo Civil, também a UE pode invocar duas datas de nascimento. A primeira "comunidade europeia" foi a do Carvão e do Aço. Remonta a 1951, quando, por inspiração dos mesmos visionários a que hoje chamamos "pais da Europa" (Robert Schuman e Jean Monnet), a França, a Alemanha e a Itália aceitaram integrar as respectivas indústrias do carvão e do aço. Eram, ao tempo, indústrias fundamentais, tanto para promover o desenvolvimento, como para fazer a guerra, conforme as opções políticas. Esse primeiro passo foi dado, não por acaso, por três dos protagonistas principais da Segunda Guerra Mundial. O medo da guerra, ainda muito presente na memória colectiva, foi a primeira aplicação prática do conceito original da União Europeia e do segredo do seu sucesso: a partilha de soberania para prevenir e evitar conflitos de interesses, ou para os resolver através do diálogo. O Tratado de Roma, cujos 50 anos agora se celebram, mantém essa preocupação de base em relação à paz. Tanto que, na verdade, foram os dois e não um os tratados assinados na capital italiana nesse mesmo dia 25 de Março de 1957: o que instituiu a Comunidade Económica Europeia (CEE) e o que criou a Comunidade Europeia da Energia Atómica, ou Euratom. Paz e desenvolvimento harmonioso - não apenas o mercado - sempre foram, portanto, os dois vectores essenciais do "sonho europeu". E para que esses objectivos essenciais nunca sejam perdidos de vista, os passos da União devem ser lentos, desde que seguros. Basta registar que o próprio tratado da fundação da CEE previa a entrada em vigor do mercado interno no ano seguinte, em 1958, e que esse mercado só veio a ser criado em... 1992. Isto quer dizerque a pressa dos europeístas mais fervorosos e dos eurocratas mais impositivos sempre foi moderada pela realidade social, económica e política do conjunto dos países e, directa ou indirectamente, pela vontade dos povos. Ainda que bem intensionada, essa pressa não é boa conselheira porque os consensos e as condições propícias para certos passos levam tempo a ser criados. Por isso, na data em que a Comunidade faz 50 anos e já se chama União, não há que lamentar, como provavelmente muitos farão, o facto dos franceses e os holandeses terem travado a Constituição. Afinal, a União tem funcionado sem ela. E ainda há duas semanas, no Conselho Europeu que aprovou os grandes objectivos em matéria climática, tivemos a prova de que pode funcionar bem. Um tratado constitucional facilitaria a governação? Sem dúvida. Mas oo mais certo é que dificultasse o entendimento. Por isso, o mais sensato e razoável é ir dando tempo ao tempo.

Sem comentários: