quinta-feira, 27 de setembro de 2007

DIAS - De vulcões e terramotos


A lembrança de vulcões e terramotos faz parte da herança de qualquer açoreano.
Mesmo os não nascidos à data, ou demasiado novos para se recordarem dos acontecimentos, trazem consigo, como seus, os relatos vividos daqueles que viram a Natureza das Ilhas no seu estado mais selvagem, indomável.

Camuflada por de trás de uma beleza sossegada, esconde-se uma natureza irrascivel, a violência dos terramotos, o ímpeto das erupções.
Afiançados na quietude da terra, construimos as nossas casas paredes-meias com vulcões adormecidos (extintos?). São eles os Senhores da terra que nós tomamos como nossa. Acontece que nos esquecemos deles; e com eles do medo.

Hoje completam-se cinquenta anos da grande erupção dos Capelinhos, na ilha do Faial.
A minha avó conta que daqui, da Terceira, se avistavam clarões para aqueles lados do mar, tão magníficos como tenebrosos.



A terra treme, mostra entranhas de lava e cinza ardentes.

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

COM TEXTO - Um café frio

Hoje é Setembro, não apenas por o ditar o Calendário.

Chove desde manhã, e se pára, a humidade torna-se uma presença quase palpável.

Acordei um pouco tarde, ao contrário do meu irmão, excitadíssimo com o seu primeiro dia de escola, no 8º ano. Eram 8.30 e ainda hesitava em afastar os lençóis, isto para ter aula de condução dali a trinta minutos... O pequeno-almoço ficou esquecido.

Afinal, quem se atrasou, não fui eu. Esperei pelo carro da instrução no parque fronteiriço à Secundária. Fiquei parada a observar de longe a agitação normal de um “primeiro dia de aulas”. Atingiu-me a plena consciência de que, oficialmente, já não tenho um lugar ali – cumpri o 12º (com êxito) e já estou matriculada no ensino superior. Mas ainda assim… aquela é a minha (Padre) Jerónimo! Sim, eu sei, estou a ter um ataque agudo de saudosismo. Lamento, não o posso evitar, nem me desculpo por me sentir assim. A anunciada "nova fase" virá a seu tempo.

De momento, brindo um sorriso aos bons anos que lá passei, à minha querida turma do Secundário, aos meus professores que se lembram sempre de mim!

Os meus pais são docentes há cerca de 20 anos; cresci ligada àquele Liceu: dos funcionários mais velhos, qual aquele que não me trouxe ao colo, ou o professor do Quadro que não sabe o meu nome. Daí que não saia de lá com a ficha ENES e simplesmente feliz por arrumar as pastas.

Sei de quem me poderá falar das deficiências de organização, da descoordenação, do número excessivo de alunos por turma, da falta de salas de aula, dos experimentalismos contraproducentes e anti-pedagógicos. Eu sei disso e sou obrigada a concordar. O ser sentimental não me torna cega às evidências.

De permeio, posso dizer que tirei algum prazer da condução, isto se não falar de um peão desmiolado que se me atravessou na frente do carro, fazendo-me travar a fundo sobre a calçada encharcada, para não lhe passar por cima.

Chego a casa, maldizendo esta humidade terrível. Subo ao quarto para ligar o computador, volto a descer para preparar o pequeno-almoço adiado, e torno a subir para me sentar à secretária, já com o msn ligado. Beberico uma chávena de café, esperando por uma companhia agradável e amiga que me desenevoe os pensamentos.

Comecei a escrever, depois de uns bons momentos de conversa, apenas perturbada por um ensurdecedor martelo pneumático na casa do lado.

Agora, a net não quer nada comigo, amuou, e o café arrefeceu completamente – o pouco que ficou na chávena está frio. E a chuva fustiga a janela ao meu lado. Para lá dela, não se vê se não em matizes de cinzento.

“Não, avó, não quero almoçar ainda. Acabei de comer, obrigada.”

Volto a tentar acordar a minha net, sem sucesso.

Revejo o texto e volto a tentar – ligou! Devagar, devagarinho… a página abriu.

domingo, 9 de setembro de 2007

COM TEXTO - Chuva

É Domingo e chove brandamente.

Pela manhã caíram bátegas violentas, e com que prazer as ouvi matraquear nas vidraças nuas da janela.

Hoje foi o som liquefeito da chuva que me despertou de mansinho, em vez dos raios de sol infiltrados que aparecem cedo na manhã.

“Está a chover”, disse baixinho, ainda envolvida no sono. E deixei-me ficar num calor que sabia contrário à chuva matinal; talvez daí o enorme gozo de se estar deitado a ouvir a chuva cair - lá fora.

Já é de tarde e continua a chover, brandamente, a intervalos irregulares.

Da secretária, olho pela janela e vejo a Cidade envolta em véus de neblina; o céu parece próximo de tão baixo que está o tecto de nuvens agregadas num enorme endredon branco e fofo. Num quintal em frente, um estendal de roupa, inadvertidamente estendida, adeja levemente com o vento que a chuva trouxe e quer acalmar.

É em dias como este que agradeço o aconchego reconfortante do meu pequeno quarto, de onde posso ver a Cidade e a chuva que lhe molha as ruas.


- E eis que ela bate no vidro, trazendo a saudade.


Foto de João Pedro Borba